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O Adicional de Periculosidade ao Trabalhador Motociclista

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O adicional de periculosidade ao trabalhador que utiliza a motocicleta como ferramenta de sua atividade laboral, trata-se de inovação trazida ao nosso ordenamento através da Lei nº 12.997 de 2014[1], a qual alterou a redação do artigo 193 da CLT[2]. Assim, inferindo que deverá o empregador adimplir com o referido adicional ao trabalhador que eventualmente trabalhar usando a motocicleta, sendo este no importe de 30% sobre o salário do empregado.

Antes de se adentrar na questão especifica, é preciso que se entenda o adicional de periculosidade, a referida rubrica pretende ressarcir o trabalhador pelo risco inerente da atividade que poderá ser exposto ao longo da sua jornada de trabalho. Assim, tem intenção retribuir possíveis danos que poderiam ser gerados ao empregado.

A proteção ao trabalhador exposto ao risco em atividades perigosas tem base constitucional, uma vez que se encontra positivada no rol dos direitos sociais e de proteção aos trabalhadores, conforme se depreende da leitura do artigo 7º, inciso XXIII:

XXIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;[3]

O Professor Carlos Henrique Bezerra de Leite ratifica que o intuito do adicional é de compensar o trabalhador pelo risco que é exposto:

 O adicional de periculosidade é parcela salarial prevista no art. 193 da CLT que tem por escopo compensar o trabalho prestado em condições que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial (Lei 12.740/2012); atividades de trabalhador em motocicleta (Lei 12.997/2014).[4]

Assim, a Lei n. 12.997 de 2014[5] trouxe ao nosso ordenamento a definição de que atividade laborativa com utilização de motocicleta possui risco acentuado a integridade do trabalhador, portanto, devendo ser ressarcido por essa exposição, sendo que a contraprestação é pecuniária, implicando-se num incremento de 30% sobre o salário do empregado.

Ocorre que a entrada em vigor da Lei trouxe inúmeros debates e dúvidas, talvez, a principal se referia a partir de que data passou ser devida a referida rubrica, isto é, a redação do § 4º do artigo 193 da CLT[6] se tratava de norma autoaplicável, ou dependia de regulamentação para se perfectibilizar sua função?

A Lei teve sua publicação no Diário Oficial da União em 20.06.2014, e posteriormente foi regulamentada através da Portaria 1.565/2014 do Ministério do Trabalho[7], o qual acrescenta atividade de motociclista no quadro de atividades da NR16 – Anexo V, o decreto regulamentador tem sua publicação ocorrida em 14.10.2014. Portanto, neste hiato de quatro meses entre a Lei e o Decreto, é onde se assenta a discussão quanto ao marco inicial do pagamento do adicional de periculosidade.

A Jurisprudência se divide quanto ao início da obrigação, mas, vem se pacificando que a Lei é autoaplicável, portanto, cabendo o trabalhador ser retribuído com o adicional de periculosidade desde a entrada em vigor da Lei, ou seja, desde 20.06.2014. Observa-se a decisão do TST sobre o tema, de relatoria do Ministro Mauricio Godinho Delgado:

RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.014/2015 E ANTERIOR À LEI Nº 13.467/2017. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. USO DE MOTOCICLETA. LEI Nº 12.997/2014 REGULAMENTADA PELA PORTARIA1.565/2014 DO MT. ANEXO 5 DA NR 16. Conforme o disposto no art. 193, § 4º, da CLT, com redação dada pela Lei nº 12.997/2014, publicada em 20.06.14 no Diário Oficial da União, o trabalho com uso de motocicleta expõe o obreiro a riscos, sendo devido o pagamento de adicional de periculosidade. O preceito legal mostra-se como autoaplicável, produzindo efeitos desde 20.06.2014, data da sua publicação, uma vez que todos os elementos para a sua tipicidade e validade são autoevidentes. A regulação pelo Ministério do Trabalho, inserindo a atividade na NR- 16, ostenta efeitos meramente administrativos, não prejudicando o direito trabalhista (adicional de periculosidade) criado pela lei especificada. De toda maneira, o referido dispositivo legal foi regulamentado pela Portaria nº 1.565/2014 do Ministério do Trabalho, que inseriu a atividade na NR16. Na hipótese, o Tribunal Regional manteve a sentença em que a Reclamada foi condenada ao pagamento de adicional de periculosidade, em face da comprovação de que o Autor utilizava a motocicleta para o desenvolvimento do seu trabalho. A Corte de origem destacou, em relação à alegação de que estariam suspensos os efeitos da Portaria 1.565/2014 do Ministério do Trabalho, que “o objeto da condenação se deu por período anterior em um dia, da publicação da norma suspensiva, a Portaria 943, de 9/7/2015”. Desse modo, o Tribunal Regional proferiu decisão em consonância com o art.193, caput, da CLT. Além do mais, não há como analisar as alegações recursais em sentido contrário do que já foi consignado pelo Regional, uma vez que, para tanto, seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, o que é defeso nesta Instância Extraordinária, conforme o disposto na Súmula 126/TST.

Recurso de revista não conhecido. (RR – 1095-45.2016.5.10.0020 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 21/08/2018, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/08/2018)

Em decorrência desta dúvida relativa ao marco inicial do pagamento do adicional, algumas entidades representativas de empresas, principalmente do setor de distribuição de bebidas, ingressaram com demandas junto a Justiça Federal questionando a legalidade da portaria regulamentadora, porém, a suspensão ficava restrita a empresas pertencentes a estas associações, bem como a maioria destas demandas já foram solucionadas, e, a obrigação de adimplir com o pagamento do adicional se tornou necessário.

Outra dúvida enfrentada nos Tribunais do Trabalho aborda o direito do adicional de periculosidade em relação ao trabalhador que utilizou a sua própria motocicleta, sem que houvesse a exigência formal do empregador para tanto, ou fosse inerente ao cargo o uso. Mas, que na rotina diária resta por utilizar sua motocicleta para cumprir as tarefas do trabalho.

Embora, sem posicionamento definitivo sobre a questão, recente decisão do Tribunal Superior do Trabalho entendeu que o empregado, no caso um estoquista, que utilizava sua moto para se deslocar entre uma loja e outra, ainda que não tivesse sido exigido à utilização da motocicleta e, inclusive fosse ofertado outra forma de transporte, seria devido o adicional de periculosidade, pois a empresa não o coibiu a prática, ao contrário, reconhecia que melhorava a produtividade do empregado.

Assim, a empresa ao permitir tacitamente, atraiu para si o ônus de ter que retribuir o profissional com o adicional de periculosidade, eis que, evidente benefício obteve o empregador com a utilização da motocicleta como meio de deslocamento do empregado. Observa-se trecho da decisão:

(…)

No caso, em que pese à possibilidade de o Reclamante realizar suas atividades utilizando-se de outros meios de transporte, restou incontroverso que o deslocamento para o cumprimento de seu ofício ocorria, habitualmente, com uso de motocicleta, com o consentimento da Reclamada.

Assim, incontroversa a utilização de motocicleta em vias públicas para a realização do seu trabalho, faz jus o Reclamante ao adicional de periculosidade. (…)

(RR-1625-94.2016.5.07.0032, 5ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 25/04/2019).

Dessa forma, podemos concluir que o trabalhador que utiliza motocicleta na sua rotina de trabalho, seja, contratado para tanto, ao exemplo dos entregadores, fiscais e motoboys, onde o uso da motocicleta é inerente a função, bem como, em outros cargos que a utilização da motocicleta a princípio não é exigência da função, mas, na prática acaba se fazendo necessária, o adicional de periculosidade será devido, e, no teor do entendimento majoritário da jurisprudência, deverá ser adimplido desde 20.06.2014.

 

[1] BRASIL. Lei n. 12.997, de 18 de junho de 2014. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L12997.htm>. Acesso em: 11 jun. 2019.

[2] BRASIL. Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm >. Acesso em: 11 jun. 2019.

[3] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 11 jun. 2019.

[4] Leite, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito do trabalho / Carlos Henrique Bezerra Leite. 9. ed. livro digital. São Paulo. Editora Saraiva Educação, 2018. p. 423.

[5] BRASIL. Lei n. 12.997, de 18 de junho de 2014. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L12997.htm>. Acesso em: 11 jun. 2019.

[6] BRASIL. Decreto-Lei n.º 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm >. Acesso em: 11 jun. 2019.

[7] BRASIL. Portaria nº 1.565, de 13 de outubro de 2014. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br/geral/tribunal2/ORGAOS/MTE/Portaria/P1565_14.html>. Acesso em: 11 jun. 2019.

Por Paulo Francisco Fontes – OAB/RS 97.338

Advogado Pós-Graduando do Curso de Especialização em Processo e Direito do Trabalho pelo Centro Educacional Damásio de Jesus. Graduado pelo Centro Universitário Ritter dos Reis.

Finalista do Prêmio CPFL Parceria Legal no ano de 2017, na categoria Excelência em Defesa.

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